Em 21 de dezembro de 2022 foi sancionada a Lei 14.478/22, que regulamenta as Criptomoedas no Brasil. Saiba o que ela representa e como anda a regulamentação dos criptoativos no Brasil, neste artigo do nosso sócio Luis Felipe S. Freire.
Em 2021 o Banco Central informou, por meio de seu departamento de estatísticas, que as importações de criptoativos somaram R$6 bilhões em 2021.
Como sabemos, o investimento em criptoativos tem aumentado exponencialmente. Parte em razão dos grandes lucros, parte em razão do anonimato e da dificuldade de rastreamento, parte pelo simples fato de não estar vinculado a nenhum país ou governo, se tornando, assim, moedas universais.
Se os criptoativos são as representações digitais de valores, as criptomoedas são as variadas modalidades ou espécies de moedas digitais que os criptoativos oferecem.
A Receita Federal adotou a definição de que o criptoativo é a “representação digital de valor, denominada em sua própria unidade de conta, cujo preço pode ser expresso em moeda soberana local ou estrangeira, transacionado eletronicamente com a utilização de criptografia e de tecnologias de registros distribuídos, que pode ser utilizado como forma de investimento, instrumento de transferência de valores ou acesso a serviços.”
PREVENÇÃO CONTRA FRAUDES
Porém, juntamente com o crescimento e popularização do investimento em criptoativos, outro fenômeno preocupante também cresce em paralelo: as fraudes com as criptomoedas.
E a preocupação é justa. Em se tratando de uma moeda universal e online, como podemos nos resguardar em caso de uma fraude?
Neste ponto, as questões de maior importância podem ser resumidas em:
- Escolha do país que você quer investir:
- Escolha da corretora/exchange para fazer a custódia (ou decisão do próprio investidor custodiar)
- Escolha da criptomoeda:
Parece um contrassenso querer investir em uma moeda universal, que não tem (ou tem pouca) regulamentação, e ao mesmo tempo escolher um país para investir.
Porém, investir em exchanges online, hospedadas em sites anônimos, geridas por pessoas anônimas é o primeiro risco que queremos evitar. Do mesmo jeito que surgiram, elas podem sumir, sem deixar rastros, como de fato já ocorreu.
Daí a importância do segundo ponto. Escolhido o país, passasse então à escolha da exchange. Deve-se, neste momento, optar por corretoras que estejam plenamente estabelecidas no seu país de residência, respeitando a legislação local. Isso facilita caso haja necessidade de procurar o poder judiciário. Não sendo possível optar pelo seu país, recomenda-se a escolha por um país confi ável, que você tenha familiaridade.
Importante também guardar todos os e-mails recebidos, contratos, políticas de privacidade e termos de uso do site da exchange. Da mesma forma, tirar regularmente prints de tela do saldo e extrato da conta, após cada movimentação (lembre-se que o site pode sair do ar e não voltar – ou voltar com saldo incorreto, o que também vem acontecendo ocasionalmente). Se o valor for signifi cativo, faça uma ata notarial, o que torna o print de tela com validade de documento ofi cial.
Algumas exchanges ficaram famosas justamente por “vender” uma imagem de segurança, respeitando a legislação local. Foi isso que ocorreu com a Gemini, a corretora criada pelos gêmeos Winklevoss do Facebook. Enfrentando a concorrência de outras casas que operavam totalmente sem regulamentação, a Gemini caminhou no sentido contrário, optando por ser a primeira corretora regulada, o que foi feito pelo Departamento Financial do estado de Nova Iorque (NYDFS). Atenção especial ao criar a conta na Exchange, com a escolha de uma senha complexa. Não menos importante é a escolha da máquina que será utilizada para acessar a conta, que deve estar atualizada, com softwares originais e antivírus. Outras recomendações podem ser encontradas em nossa cartilha de crimes digitais, disponível gratuitamente em https://cartilhas.silvafreire. com.br/crimes-internet.
Outra recomendação é fugir de terceiros que se oferecem como intermediários, sempre prometendo ganhos altos e rápidos, pois é aí que ocorrem as fraudes tipo “pirâmides”, onde o investidor novo paga o retorno do investidor antigo, até que o terceiro desapareça com o dinheiro de todos.
Por outro lado, também é possível o próprio investidor custodiar seus criptoativos, sem o intermediários. E aqui está a grande inovação dos criptos: é possível guardar fortunas inteiras em um telefone ou outro dispositivo eletrônico. Por isso, neste caso, alguns cuidados são indispensáveis: ter uma carteira segura (recomendável a chamada carteira fria), guardar suas chaves com segurança, e não colocar todas suas criptomoedas em um só dispositivo.
Finalmente, a última é a escolha da criptomoeda. Cada uma possui suas características particulares. Pesquise quais empresas estão por trás do projeto, leia comentários de especialistas, confira a capitalização do mercado, volume de negociações e, principalmente, escolha levando em consideração seu perfil de investidor.
Importante também guardar todos os e-mails recebidos, contratos, políticas de privacidade e termos de uso do site da exchange. Da mesma forma, tirar regularmente prints de tela do saldo e extrato da conta, após cada movimentação (lembre-se que o site pode sair do ar e não voltar – ou voltar com saldo incorreto, o que também vem acontecendo ocasionalmente). Se o valor for significativo, faça uma ata notarial, o que torna o print de tela com validade de documento oficial.
LEGISLAÇÃO APLICÁVEL AOS CRIPTOATIVOS NO BRASIL
LEI 14.478/22
Em 21 de dezembro de 2022 foi sancionada a Lei 14.478/22.
Recentemente, o Senado Federal enviou para sanção presidencial o projeto que regula as criptomoedas no Brasil. Trata-se do Projeto de lei 4.401/2021, aprovado em 29/11/2022.
O texto aprovado estabelece que são consideradas prestadoras de serviços de ativos virtuais aquelas pessoas jurídicas que executam serviços como troca, em nome de terceiros, de moedas virtuais por meda nacional ou estrangeira; troca entre um ou mais ativos virtuais; transferências deles; custódia ou administração, mesmo que de instrumentos de controle; e participação em serviços financeiros e prestação de serviços relacionados à oferta por um emissor ou à venda de ativos virtuais.
O texto também cria um ilícito de “estelionato” no Código Penal, com pena de 4 a 8 anos para quem obtiver vantagem ilícita em prejuízo alheio, induzindo ou mantendo terceiro em erro. Também tipifica os crimes praticados com uso de ativos virtuais, na Lei de Lavagem de Dinheiro (Lei 9.613/98).
Estabelece, finalmente, a obrigação das empresas de manter registro das transações para fins de repasse de informações aos órgãos de fiscalização e combate ao crime organizado e à lavagem de dinheiro
O usuário ganhará muito em termos de segurança, sem nenhum impacto em seu dia-a-dia, pois o aumento da segurança não ocasionará nenhuma mudança para quem apenas compra e vende criptos.
COMISSÃO DE VALORES MOBILIÁRIOS
Em 2017 a CVM se antecipou para estabelecer regras para as Ofertas Iniciais de Moedas (Initial Coin Offerings – ICO), em analogia às Ofertas Iniciais de Ações (IPO). O objetivo do ICO seria a arrecadação de capital para investidores através das criptomoedas, com a emissão de tokens.
Diante disso, a CVM estabeleceu que o ICO deve seguir as mesmas regras do IPO, por representarem valores mobiliários para os fins do art. 2o da Lei 6.385/76.
Em maio/2020 foi publicada a Instrução 626, regulamentando a constituição e funcionamento de um ambiente regulatório experimental, que tinha o objetivo de validar e moldas as possíveis normas e regras jurídicas que virão a reger o mercado, por meio do que é chamado de Sandbox Regulatório.
O ano de 2021 foi especialmente importante, em razão do registro de mais de 20 fundos brasileiros com autorização para investir em criptomoedas.
Em 11/10/2022, a CVM publicou o Parecer de Orientação 40 (não vinculante), consolidando o entendimento da autoarquia sobre as normas aplicáveis aos criptoativos que forem valores mobiliários.
BANCO CENTRAL DO BRASIL
Em 2021 o BC divulgou as diretrizes para emissão de uma moeda virtual no Brasil, com as mesmas finalidades da moeda fiduciária. O projeto é de iniciar a fase piloto em 2022 e a implementação em 2023.
RECEITA FEDERAL DO BRASIL
Em outubro de 2018 a RFB publicou a Instrução Normativa 1888/19, que determinou a obrigatoriedade de prestação de informações à Receita Federal de todas as operações de compra e venda de criptomoedas realizadas por exchanges domiciliadas em território brasileiro, sem nenhum limite de valor. E para operações em exchanges domiciliadas no exterior, as informações deverão ser prestadas sempre que o valor mensal ultrapassar R$30 mil.
Dentre as informações prestadas, estão a data de operação, tipo de operação, titulares da operação, relação dos criptoativos usados na operação, quantidade destes criptoativos, valor da operação em reais e valor das taxas de serviços cobradas para execução da operação.
LEGISLAÇÃO BRASILEIRA
A Lei do Colarinho Branco (lei federal 7.492/86) foi instituída em 1986, com o objetivo de definir o que é considerado crime contra o Sistema Financeiro Nacional (SFN) e quais medidas devem ser adotadas para cada um deles, com penas que podem chegar a 12 anos de prisão.
O crime mais popular que se aplica às criptomoedas, entretanto, é o de lavagem de dinheiro, que foi regulamentado pela Lei 9.613/98.
A lista de crimes financeiros foi definida na Lei 7.496/86, que incluem, por exemplo:
- fabricação não autorizada de papel representativo de valor (dinheiro em espécie);
- emissão, oferecimento ou negociação irregular de títulos ou valores mobiliários;
- falsidade em demonstrativos contábeis;
- empréstimo ou adiantamento vedados;
- operação de câmbio com falsa identidade e prestação de informação falsa nessas operações;
- operação de câmbio para fins de evasão de divisas;
- desvio de finalidade.
CÓDIGO PENAL
Outros crimes podem estar relacionados às criptomoedas, como os casos abaixo:
Estelionato: “Obter, para si ou para outrem, vantagem ilícita, em prejuízo alheio, induzindo ou mantendo alguém em erro, mediante artifício, ardil, ou qualquer outro meio fraudulento”.
Invasão de Dispositivo Informático: “Invadir dispositivo informático de uso alheio, conectado ou não à rede de computadores, com o fim de obter, adulterar ou destruir dados ou informações sem autorização expressa ou tácita do usuário do dispositivo ou de instalar vulnerabilidades para obter vantagem ilícita.”
CONCLUSÃO
Os criptoativos vieram para ficar. Mais cedo ou mais tarde, todos estaremos cercados por eles.
Por isso, importante entender e conhecer suas características, riscos e benefícios.
Vítimas de crimes relacionados aos criptoativos devem agir rápido, não apenas para preservar as provas no meio eletrônico, como também para responsabilizar e efetivamente conseguir arrestar valores que assegurem eventuais prejuízos.
Da mesma forma, empresas que desejam se estabelecer como exchanges podem sofrer uma gama variada de problemas: invasão de seus sistemas, utilização dos sistemas para cometimento de crimes ou lavagem de dinheiro, venda de produtos ilícitos, entre outros. Diante desse cenário, é indispensável ter uma assessoria jurídica ágil e eficaz para trabalhar e agir com rapidez, pois a demora e/ou omissão pode gerar responsabilidade direta de funcionários, gestores e sócios.
O tema de criptoativos ainda é novo e o volume de decisões judiciais que permitem formar jurisprudência (reiteradas decisões no mesmo sentido) ainda é pequeno.
As áreas de Direito Digital e Direito Bancário são especialidades da Silva Freire Advogados e estão à disposição para esclarecimento de dúvidas, orientações e análise de casos.
(*) Luis Felipe S. Freire é advogado, sócio da Silva Freire Advogados, com notória experiência em direito digital e societário, com participação em importantes operações de fintechs.
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