Belo Horizonte, 15 de fevereiro de 2007
A retirada da gratificação de caixa executivo de um funcionário no mesmo dia em que foi notificada de que este havia ajuizado ação trabalhista resultou na condenação da Caixa Econômica Federal ao pagamento de indenização por dano moral de R$ 75 mil, além da determinação de reintegração do caixa a sua função original. A Primeira Turma do Tribunal Superior do Trabalho negou provimento a agravo de instrumento da CEF contra a decisão do Tribunal Regional do Trabalho da 9ª Região (Paraná), em processo relatado pelo juiz convocado Guilherme Caputo Bastos.
O episódio que deu origem ao processo ocorreu na cidade paranaense de Cianorte. O economiário entrou para o quadro da CEF em 1982, e de novembro de 1985 até maio de 2001 exercia a função comissionada de caixa executivo. Em março de 2001, ajuizou na Vara do Trabalho de Cianorte reclamação trabalhista em que pedia horas extras, reflexos e integrações. A CEF foi notificada da ação no dia 25 de maio – e, na tarde do mesmo dia, o caixa foi comunicado de sua destituição da função ocupada durante 15 anos, sendo designado para a função de escriturário.
Em nova ação trabalhista, o empregado pediu sua reintegração à função e indenização por dano moral. “O que pretende a CEF com tal atitude senão impor o medo, o temor a seus empregados, intimidando-os a não irem a juízo na busca de seus direitos, sob pena de sofrerem retaliações, fazendo desse trabalhador o ‘bode expiatório’?”, questionava a inicial. De acordo com depoimentos colhidos na fase de instrução, no dia em que a CEF recebeu a notificação o trabalhador teria conversado com um colega (que compareceu como preposto da CEF à audiência e confirmou a conversa) e este lhe disse que “deveria suportar as conseqüências”. Na tarde do mesmo dia, recebeu ligação do mesmo colega informando que, por ordem da gerência, estava destituído de sua função.
O juiz concluiu que o trabalhador foi “vítima de cruel e bizarra discriminação”. A sentença foi mantida pelo TRT/PR. As duas instâncias afastaram uma a uma as alegações da CEF para a destituição. A primeira era a de que o empregado “já vinha há algum tempo se mostrando insatisfeito com o trabalho”, e que isso estaria se refletindo em suas atividades. Sobre isso, os documentos e testemunhos juntados ao processo demonstraram que “se tratava do caixa mais antigo da agência, o que fazia o maior número de autenticações e vendia o maior número de seguros”.
Outra alegação foi a de que o caixa teria juntado, na primeira reclamação trabalhista, cópias de fitas de terminais de caixa para provas as horas extras, o que foi considerado “abuso de confiança” por tornar públicas movimentações financeiras de clientes, violando o sigilo bancário. O juiz, porém, ressaltou que tais documentos “não se referem a operações financeiras protegidas pelo sigilo bancário”, e que o fato ocorreu num processo judicial, “na defesa do direito pessoal do trabalhador”.
Finalmente, a CEF alegou ainda que a destituição fazia parte de um processo de reestruturação da agência. Constatou-se, porém, que não houve outra perda de função em 2001, e que no ano anterior os funcionários remanejados não perderam suas gratificações.
No exame do pedido de indenização por dano moral, a sentença cita as “listas negras”, pelas quais empregadores evitam contratar ou despedem empregados que ajuízam reclamações trabalhistas, “ato dos mais reprováveis, que implica negação da cidadania do trabalhador e descumprimento da Constituição Federal”. A indenização foi arbitrada em R$ 75.000,00, valor mantido pelo TRT, que, verificando que o caixa recebia aproximadamente R$ 2.700,00 mensais, considerou não ter havido excesso em sua fixação. O Regional negou seguimento ao recurso de revista da CEF, motivando o agravo de instrumento julgado pela Primeira Turma.
Nas razões do agravo, a Caixa questionou se, diante dos fatos contidos no processo, “a destituição do empregado da função de confiança atingiu sua honra e dignidade, apresentando-se como ato ilícito indenizável”, conforme prevê o Código Civil de 1916 (artigo 5º) e a Constituição Federal. O relator citou a decisão do TRT, segundo a qual “é perfeitamente compreensível e natural a dor pela perda da função exercida por mais de 15 anos em razão de uma arbitrariedade do empregado, que buscou causar no autor o temor reverencial, o arrependimento por ter ajuizado ação através da qual buscava a satisfação de seus direitos trabalhistas”.
Embora a retirada da função de confiança não seja, em si, causa de dano moral, o juiz Guilherme Bastos ressalta que “não foi somente a destituição que levou ao reconhecimento da existência do dano moral, mas sim as circunstâncias, o motivo, que revelou-se estar fundado em critérios discriminatórios, já que a destituição ocorreu tão somente em virtude do ajuizamento da ação trabalhista”. Quanto aos motivos, o relator considerou que “a discussão a respeito esgotara-se na segunda instância”, e seu reexame seria contrário à Súmula 126 do TST, que veda a apreciação de fatos e provas nesse grau de jurisdição. (AIRR 733/2001-092-09-40.7).
Fonte: Tribunal Superior do Trabalho (www.tst.gov.br)