Artigo publicado em 21/02/2005
Jornal Estado de Minas
Seção opinião, p. 7
Autor: Geraldo Magela S. Freire – OAB/MG 15.748
JUSTIÇA GRATUITA
Geraldo Magela S. Freire
Presidente da Comissão de Defesa do Consumidor da OAB-MG
Sob o título “ASSISTÊNCIA A QUEM PRECISA”, o (EM 16/02) publicou artigo em 16 do corrente, do preclaro desembargador Eduardo Andrade, que empresta ao Poder Judiciário sua privilegiada inteligência, como representante dos advogados no quinto constitucional. Anota o precitado artigo que 70% das ações propostas em Belo Horizonte pleiteiam assistência judiciária gratuita, cabendo ao magistrado determinar que o postulante comprove sua efetiva necessidade “ou até mesmo indefira desde logo tal pedido, conforme o caso.”.
Após a lei que mandou repassar ao Judiciário os valores recebidos com as custas, uma minoria de magistrados tem exigido poderes expressos na procuração, solicitação manuscrita do pedido diretamente pelo interessado, ou determinando seja oficiado ao postulante para que não pague honorários advocatícios etc e outras exigências extravagantes e ilegais. São posicionamentos que dificultam o acesso do cidadão à Justiça, ao lado do aumento exagerado do valor das custas.
Por provocação do professor Raimundo Cândido Junior, Presidente da Seccional mineira, a OAB Nacional propôs Ação Direta de Inconstitucionalidade no Supremo Tribunal Federal, pretendendo obstacular mais essa voracidade fiscal contra o cidadão. Com efeito, o binômio sempre perseguido pela sociedade é de Justiça célere e acessível aos menos afortunados, porque um direito fundamental do cidadão, que continua inatingido, apesar do grande sacrifício dos magistrados, trabalhando até mesmo nos sábados e domingos em suas residências. E como direito constitucional fundamental jamais deve ser interpretado contra o sentido social a que visa proteger.
O Judiciário tem que se vangloriar da grande massa de cidadãos que o procura, após a Constituição Cidadã de 1988, demonstrando confiança e respeito ao melhor dos três poderes da República, apesar da lerdeza e do formalismo. Necessitado não é apenas o miserável, mas todo aquele que, no momento da postulação, está em situação financeira que não lhe permita pagar as custas e taxas do processo e os honorários de advogado, sem prejuízo do sustento próprio ou da família (art.. 2º, parágrafo único, da Lei n. 1.060). Ou seja, não é pobre. Está pobre, no momento da postulação.
A assistência judiciária é fornecida pelo Estado, possibilitando ao necessitado o acesso aos serviços profissionais do advogado mediante a defensoria pública ou pela designação de um profissional pelo Juiz. Justiça gratuita consiste na isenção de todas as despesas inerentes à demanda requerida pelo advogado contratado pelo cidadão. Em acórdão da lavra do eminente Ministro Carlos Mário Veloso, o excelso Supremo Tribunal Federal assentou que, para a obtenção da gratuidade de justiça, basta a declaração feita pelo interessado de que está pobre para vir ajuízo, e que a Lei n. 1060/50 põe-se dentro no espírito da Constituição Federal “que deseja que seja facilitado o acesso de todos à Justiça” (RE 2G5.029-6 – RS – 2T. – in DJU 07.03.1997).
Na hermenêutica o sentido de um texto não vem só de seus autores e das palavras que usaram. Os destinatários são também co-autores na medida que inserem a mensagem dentro dos contextos vitais em que se acham. Então, o sentido original ganha novas ressonâncias quando presentes certas circunstâncias. A lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito, diz o artigo 5º, inciso XXXV da Constituição. Ou o dinheiro, mais uma vez, deve impedir a fluência desse direito constitucional fundamental?
(artigo publicado no Jornal ESTADO DE MINAS, seção de Opinião, p. 7, em 21/02/2005)