Belo Horizonte, 6 de março de 2008
Publicado na Revista Mens Legis, Ano II, nº 6, mar/abr/mai 2008
“Nada na vida é certo, exceto a morte e os impostos.” – Benjamim Franklin / Século XVIII
Nos dias de hoje, diante da elevada carga tributária imposta pelo Governo Federal nos últimos anos, a recuperação tributária de eventuais créditos extemporâneos de tributos federais é instrumento hábil e de suma importância para a manutenção ou recuperação da saúde fiscal das empresas, mesmo que esta esteja sobre uma tênue linha da evasão fiscal. A escolha do instituto da compensação de tributos devidos, com créditos do particular em face do fisco, é permitida em nossa legislação, desde que satisfeitos certos requisitos para tanto. Primeiramente, vale lembrar que a matéria está prevista no Código Tributário Nacional, no caput do art. 170:
“Art. 170. A lei pode, nas condições e sob as garantias que estipular, ou cuja estipulação em cada caso atribuir à autoridade administrativa, autorizar a compensação de créditos tributários com créditos líquidos e certos, vencidos ou vincendos, do sujeito passivo contra a Fazenda Pública.”
O Contribuinte que apurar crédito, inclusive o reconhecido por decisão judicial transitada em julgado, relativo a tributo ou contribuição administrado pela SRF do Brasil, passível de restituição ou de ressarcimento, pode utilizá-lo na compensação de débitos próprios, vencidos ou vincendos, relativos a quaisquer tributos e contribuições administrados pela SRF. Tal compensação deve ser efetuada pelo sujeito passivo mediante apresentação à SRF do Brasil da Declaração de Compensação gerada a partir do Programa PER/DCOMP ou, na impossibilidade de sua utilização, mediante a apresentação do formulário Declaração de Compensação constante do Anexo IV da Instrução Normativa SRF nº 600, de 28 de dezembro de 2005, ao qual deverão ser anexados documentos comprobatórios do direito creditório.
Desde logo se verifica que o CTN é expresso ao afirmar que a lei poderá permitir a compensação, desde que seja ela feita com a utilização de créditos líquidos e certos. Não basta, assim, que existam hipotéticos pagamentos de um tributo posteriormente julgado indevido: “é preciso que exista a certeza do pagamento, bem como o valor atualizado do seu montante. Neste entendimento, se não há a certeza da existência dos pagamentos devidos, ou se estes não são líquidos, não é possível compensar (art. 170 do CTN). Por conseqüência, qualquer decisão judicial que autorize a compensação de créditos ilíquidos ou incertos estará violando o art. 170 do CTN. Ademais, o crédito para se revestir dos atributos de liquidez e certeza, há, de antemão, de ser quantificado, com a especificação ou indicação da quantia exata, da importância certa e determinada. Não são compensáveis créditos indicado aleatoriamente, sob alegação de que o tributo (ou a contribuição) foi pago indevidamente, em determinado período” (art. 66 da Lei nº 8.383/91).
A compensação declarada à SRF extingue o crédito tributário, sob condição resolutória da ulterior homologação do procedimento, sendo que o prazo para homologação da compensação declarada pelo sujeito passivo é de 5 (cinco) anos, contado da data da entrega da declaração de compensação.Com isso, uma vez questionáveis os créditos compensados por parte da Receita, longa será a discussão administrativa e posteriormente judicial a respeito dos ativos usados e contabilizados e também do embasamento legal acerca dos procedimentos adotados para seu aproveitamento pela Empresa que, apesar de sentir uma imediata melhora do fluxo de caixa, poderá, depois de uma longa discussão judicial, se ver obrigada a arcar com penosas multas. A própria declaração de compensação constitui confissão de dívida e instrumento hábil e suficiente para a exigência dos débitos indevidamente compensados, se este for o caso. Se porventura o fisco federal discordar da compensação realizada pelo contribuinte, irá, através de um despacho (decisório) não homologar a compensação, cientificando-se o sujeito passivo(Empresa), intimando-o a efetuar o pagamento dos débitos indevidamente compensados no prazo de 30 (trinta) dias, contados da ciência do ato que não a homologou.
Facultativamente e no mesmo prazo, poderá o contribuinte, discordando do referido despacho decisório, optar pela apresentação de “Manifestação de Inconformidade”, que, em caso de novo indeferimento pela autoridade administrativa de julgamento comportará então Recurso Voluntário para o Conselho de Contribuintes do Ministério da Fazenda Nacional (Brasília/DF). Caso não sejam acolhidos os argumentos do referido recurso voluntário, o Contribuinte poderá, ainda, ofertar recurso especial (chamado por alguns como “recurso de divergência”) para a C.S.R.F.(Câmara Superior de Recursos Fiscais), instância máxima do mesmo Conselho de Contribuintes do Ministério da Fazenda Nacional.
Só então, se denegados todos estes recursos, é que o crédito tributário estará definitivamente constituído, podendo o débito ser encaminhado à Procuradoria Geral da Fazenda Nacional (PGFN) para inscrição em Dívida Ativa Da União. Com isso, será inaugurada uma nova etapa, que será a cobrança judicial. Em outras palavras, o FISCO, com base na Lei 6.830/80, ingressará com Ação de Execução Fiscal em face do Contribuinte, cabendo a este nomear bens à penhora, e a seguir, depois de lavrado o respectivo termo e intimação da penhora havida (momento no qual o juízo se tornou seguro), no trintídio legal subseqüente, opor embargos à Execução Fiscal, visando a discussão da existência ou não do crédito tributário (composto pelo valor compensado e não-homologado, acrescido de multa de mora e atualização via taxa selic), ficando então suspensa a exigibilidade da cobrança desse mesmo crédito tributário, gerando para o contribuinte o direito de obter certidão positiva de efeito negativo (art. 206, do CTN) até o encerramento do processo judicial (trânsito em julgado), já que estarão acautelados os interesses fazendários com a penhora.
Poderá ainda o contribuinte, antes mesmo de ser ajuizada a execução fiscal, promover ação anulatória de débito, com depósito integral do montante exigido, para fins de discutir meritoriamente as compensações realizadas e, ao mesmo tempo, impedir a distribuição da ação de execução fiscal, evitando penhoras paralelas. Parte da jurisprudência hodierna ainda admite ao contribuinte promover uma ação cautelar de caução, visando oferecimento e penhora de bens, acautelando outrossim os interesses do fisco da mesma forma como ocorre na penhora de bens realizada no bojo de uma execução fiscal, permitindo-lhe, no prazo de 30 dias subseqüentes à caução, promover a mesma ação anulatória de débito acima especificada, porém, agora, desacompanhada de depósito.
Será lançada multa isolada em razão da não-homologação de compensação declarada pelo sujeito passivo nas hipóteses em que ficar caracterizada a prática das infrações de sonegação, fraude ou conluio, conforme definidas nos arts. 71 a 73 da Lei nº 4.502, de 30 de novembro de 1964. Pela nova redação dada ao artigo 44, da Lei 9430/96, pela Lei 11.488/2007, para os casos de ausência de pagamento tributário a multa aplicada é de 75%. Porém, se houver comprovação das situações descritas nos artigos 71 a 73, da Lei 4.502/64, essa mesma multa já é majorada para 150% e, caso o sujeito passivo não atenda no prazo determinado a intimação para prestar esclarecimentos nas referidas situações, a multa será elevada para 225% e terá como base de cálculo o valor total do débito indevidamente compensado. Desta forma, o conhecimento e a utilização de todas as possibilidades de créditos bem como o respeito às limitações impostas pela legislação devem ser eleitas pela administração das empresas como ponto primordial para a sua regularidade financeira.
E neste sentido, é de extrema relevância que as empresas tenham a assessoria de profissionais com profundo conhecimento da Legislação, visando utilizar ao máximo os direitos que detém, sem desrespeitar os limites legais, evitando-se assim que atuais falsos benefícios futuramente tornem-se elevadas dívidas fiscais..
(*) Henrique Affonso Silva Freire é Advogado Tributarista e sócio no escritório Silva Freire Advogados.