Inovações Societárias do Marco Legal das Startups na Lei das Sociedades Anônimas


Artigo originalmente publicado no livro Direito Societário – Desafios Atuais e Pós-Pandêmicos, Editora Expert.

1. INTRODUÇÃO

Temos hoje no país um universo de 13.673 startups, de acordo com a Associação Brasileira de Startups – Abstartups[3].

Esse importante mercado é essencial para o desenvolvimento do país, fortalecendo a economia e criando um ambiente de inovação, formando um ciclo sustentável de fomento e crescimento.

E foi justamente isso que deu origem ao Marco Legal das Startups, instituído pela Lei Complementar – LC, nº 182 de 1º de junho de 2021.

Toda essa importância pode ser traduzida nos princípios e diretrizes da lei (art. 3º), que podem ser resumidos nos seguintes pontos:

  1. Reconhecimento de que o empreendedorismo inovador é um vetor de desenvolvimento econômico, social e ambiental;
  2. Incentivar a criação de ambientes favoráveis ao empreendedorismo e à inovação, valorizando a segurança jurídica e liberdade contratual como forma de propiciar o investimento e crescimento da oferta de capital direcionado a iniciativas inovadoras;
  3. Valorização das empresas e do livre mercado, como agentes de transformação;
  4. Modernização do ambiente de negócios;
  5. Incentivo ao empreendedorismo inovador como forma de criar produtividade e competitividade, com a geração de empregos;
  6. Aperfeiçoar as políticas públicas para favorecer o empreendedorismo inovador;
  7. Fomentar a interação entre os setores público e privado;
  8. Incentivo ao Poder Público para contratar soluções inovadoras elaboradas ou desenvolvidas por startups; e
  9. Promover a competitividade nacional e internacional das empresas brasileiras e atrair investimentos estrangeiros.

Assim, o objetivo do presente trabalho é analisar e comentar as inovadoras mudanças introduzidas na Lei das Sociedades Anônimas – LSA, pelo Marco Legal das Startups.

2. A QUEM SE APLICA A LEI. CONCEITO DE STARTUP.

E quais são as empresas que serão protegidas e incentivadas por meio dessa lei? À exceção da alteração introduzida pelo art. 143[4](que passa a valer para todas as companhias), a resposta está em seu art. 4º:

São enquadradas como startups as organizações empresariais ou societárias, nascentes ou em operação recente, cuja atuação caracteriza-se pela inovação aplicada a modelo de negócios ou a produtos ou serviços ofertados.

(Lei Complementar – LC, nº 182 de 1º de junho de 2021[5])

            Percebe-se, então, que a inovação está diretamente ligada ao conceito. Essa inovação pode ser dividida pela doutrina nos seguintes tipos (NYBO et al., 2016, p. 30):

a) Incremental: aperfeiçoa um produto, processo de produção ou serviço (O´SULLIVAN e DOOLEY, 2009, p. 23). Este tipo de inovação visa aumentar a competitividade de um produto ou serviço que já está à disposição no mercado;

b) Radical: efetua transformações expressivas em algo já estabelecido (O´SULLIVAN e DOOLEY, 2009, p. 23), resultando em eficiência muito maior do que a anterior ou alto impacto nas receitas de uma empresa.

c) Disruptiva: a inovação disruptiva está dentro do gênero “radical”. Trata-se comumente de inovações que alteram radicalmente as práticas de negócio ou a integralidade de um setor industrial. Este tipo de inovação está, geralmente, associado à criação de novas tecnologias (O´SULLIVAN e DOOLEY, 2009, p. 25).

A lei também cria algumas condicionantes para o enquadramento como startup, que podem ser assim sintetizados:

  1. Receita Bruta de até R$16 milhões;
  2. Máximo de 10 (dez) anos de inscrição no Cadastro Nacional de Pessoa Jurídica da Receita Federal;
  3. Atender, no mínimo, a um dos seguintes requisitos:
    1. Declaração e utilização de modelos de negócios inovadores; ou
    1. Enquadramento no regime especial Inova Simples

3. INOVAÇÕES SOCIETÁRIAS DO MARCO LEGAL DAS STARTUPS

3.1. PROTEÇÃO AOS INSTRUMENTOS JURÍDICOS DE INVESTIMENTO

O capítulo III da LC vem proteger os instrumentos jurídicos utilizados para formalizar o investimento em inovação.

Como já mencionado, uma das intenções do legislador é de criar um ambiente com segurança jurídica, que fomente investimentos.

Para tanto, foi feliz o legislador em esclarecer que o investidor não será considerado como integrante do capital social da empresa, quando este for realizado pelos seguintes instrumentos (§1º do art. 5º da LC):

  1. contrato de opção de subscrição de ações ou de quotas celebrado entre o investidor e a empresa;
  2. contrato de opção de compra de ações ou de quotas celebrado entre o investidor e os acionistas ou sócios da empresa;
  3. debênture conversível emitida pela empresa nos termos da Lei nº 6.404, de 15 de dezembro de 1976;
  4. contrato de mútuo conversível em participação societária celebrado entre o investidor e a empresa;
  5. estruturação de sociedade em conta de participação celebrada entre o investidor e a empresa;
  6. contrato de investimento-anjo na forma da Lei Complementar nº 123, de 14 de dezembro 2006;
  7. outros instrumentos de aporte de capital em que o investidor, pessoa física ou jurídica, não integre formalmente o quadro de sócios da startup e/ou não tenha subscrito qualquer participação representativa do capital social da empresa.

O investimento em empresas por meio dos instrumentos acima não é novo e o entendimento dos tribunais também é no sentido de, nestes casos, o investidor não ser considerado como integrante do capital da empresa.

Porém, visando dar segurança jurídica e afastar até mesmo decisões isoladas da justiça trabalhista e de alguns poucos julgadores em casos tributários e/ou societários, entendemos ser eficiente o esclarecimento do assunto, especialmente considerando o aspecto externo, que visa atrair investimentos estrangeiros. Assim dispôs a lei:

Art. 8º O investidor que realizar o aporte de capital a que se refere o art. 5º desta Lei Complementar:

I – não será considerado sócio ou acionista nem possuirá direito a gerência ou a voto na administração da empresa, conforme pactuação contratual;

II – não responderá por qualquer dívida da empresa, inclusive em recuperação judicial, e a ele não se estenderá o disposto no art. 50 da Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002 (Código Civil), no art. 855-A da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), aprovada pelo Decreto-Lei nº 5.452, de 1º de maio de 1943, nos arts. 124, 134 e 135 da Lei nº 5.172, de 25 de outubro de 1966 (Código Tributário Nacional), e em outras disposições atinentes à desconsideração da personalidade jurídica existentes na legislação vigente.

Obviamente que as disposições acima não se aplicam caso reste configurado dolo, fraude ou simulação com o envolvimento do investidor, conforme estabelece o parágrafo único do art. 8º.

Ainda de acordo com a lei, todos os valores investidos deverão ser registrados contabilmente.

3.1.1. DEBÊNTURES CONVERSÍVEIS EM AÇÕES

Uma das formas de investimento que merece ser rapidamente abordada no presente estudo é justamente a mais segura delas: emissão de debêntures conversíveis em ações.

É justamente em virtude dela que a LC 182 vem fazer alterações (que abordaremos mais adiante) na LSA, que regulamentam esta modalidade de investimento.

Coelho (2008, p 146) esclarece que:

A lei não define debêntures, limitando-se a especificar que elas conferem aos seus titulares direito de crédito, nas condições mencionadas pela escritura de emissão e certificado (LSA, art. 52). A doutrina, ressaltando tratar-se a emissão de debêntures de uma operação de empréstimo, costuma apresentá-las como parcelas de um contrato de mútuo, em que a sociedade anônima emissora é a mutuária e os debenturistas os mutuantes (Ferreira, 1962:240/241; Martins, 1977, 1:311).

Assim, a Companhia, por autorização do art. 57 da LSA, pode emitir debênture, com cláusula de correção monetária e juros, que seja conversível em ações, respeitadas as condições estipuladas na escritura de emissão, que deve especificar (art. 57 da LSA):

I – as bases da conversão, seja em número de ações em que poderá ser convertida cada debênture, seja como relação entre o valor nominal da debênture e o preço de emissão das ações;

II – a espécie e a classe das ações em que poderá ser convertida;

III – o prazo ou época para o exercício do direito à conversão;

IV – as demais condições a que a conversão acaso fique sujeita.

COELHO (2008, p 63) também pensa da mesma forma: “A limitação da responsabilidade e a negociabilidade da participação societária, características da anônima, revelam os mecanismos apropriados à atração desse capital”.

4. ALTERAÇÕES NA LSA (LEI 6.404/76)

Como mencionado no início deste trabalho, um dos princípios do Marco Legal das Startups é de fomentar os investimentos e a economia, criando um ambiente favorável.

E uma das formas propostas pelo legislador foi justamente de facilitar e incentivar a escolha pelo tipo societário mais seguro e transparente existente: a sociedade anônima.

Diante desse cenário, a LC 182 veio promover alterações na LSA, que serão a seguir apresentadas.

Essas mudanças vêm em bom momento, para incentivar a escolha pelas Sociedades Anônimas.

De acordo com o Mapa de Empresas[6] , ferramenta disponibilizada pelo governo federal, o boletim do 1º quadrimestre/2021 aponta existirem hoje 168.716 Sociedades Anônimas ativas, sendo 4.215 abertas apenas no período de janeiro a abril/21. Esse número ainda é pequeno quando comparado com a quantidade de empresas ativas formadas por Empresário Individual – incluindo MEI (11.959.354), limitadas (3.967.740) e EIRELI (984.250).

A expectativa é que esse número aumente e a escolha por este importante tipo societário se torne ainda mais comum.

4.1. REDUÇÃO DO NÚMERO MÍNIMO DE DIRETORES – ALTERAÇÃO ART. 143 DA LSA

A primeira modificação foi no art. 143 da LSA, que possuía a seguinte redação:

Art. 143. A Diretoria será composta por 2 (dois) ou mais diretores, eleitos e destituíveis a qualquer tempo pelo conselho de administração, ou, se inexistente, pela assembléia-geral, devendo o estatuto estabelecer:

A LC 182 reduziu as exigências, permitindo que a diretoria seja composta por apenas 1 (um) diretor.

O objetivo claro é simplificar e reduzir o custo de manutenção da S/A, permitindo que sejam constituídas companhias menores, com apenas 1 (um) diretor.

As exigências para o Estatuto, por outro lado, não mudaram. Permanece a necessidade dele estabelecer:

I – o número de diretores, ou o máximo e o mínimo permitidos;

II – o modo de sua substituição;

III – o prazo de gestão, que não será superior a 3 (três) anos, permitida a reeleição;

IV – as atribuições e poderes de cada diretor.

4.2. FLEXIBILIZAÇÕES PARA COMPANHIAS MENORES – ALTERAÇÃO ART. 294 DA LSA

Outra modificação foi no art. 294, que estabelece alguns benefícios para empresas que estejam enquadradas nos conceitos nele estabelecidos. A redação anterior do referido artigo era:

Art. 294. A companhia fechada que tiver menos de 20 (vinte) acionistas, com patrimônio líquido de até R$ 10.000.000,00 (dez milhões de reais), poderá:  (Redação dada pela Lei nº 13.818, de 2019)        

I – convocar assembléia-geral por anúncio entregue a todos os acionistas, contra-recibo, com a antecedência prevista no artigo 124; e

II – deixar de publicar os documentos de que trata o artigo 133, desde que sejam, por cópias autenticadas, arquivados no registro de comércio juntamente com a ata da assembléia que sobre eles deliberar.

O caput fora, então, alterado para permitir que sejam enquadradas nos benefícios as companhias que tenham renda bruta anual de até R$78 milhões, aumentando o leque de empresas que poderão se valer de suas benesses.

Art. 294. A companhia fechada que tiver receita bruta anual de até R$ 78.000.000,00 (setenta e oito milhões de reais) poderá:    (Redação dada pela Lei Complementar nº 182, de 2021)

Ou seja, excluiu-se a obrigatoriedade da empresa ter patrimônio líquido de R$10 milhões e menos de 20 acionistas, para permitir que sejam beneficiadas todas as companhias que tenham receita de até R$78 milhões, independentemente do número de acionistas e de seu patrimônio líquido.

Também foram revogados os incisos I e II, bem como criados os incisos III e IV.

O inciso primeiro permitia que as empresas relacionadas no caput convocassem assembleia geral por anúncio entregue a todos os acionistas, contra-recibo, com a antecedência prevista no art. 124, ou seja, com antecedência de 8 dias para companhias fechadas (segunda convocação com 5 dias de antecedência) e de 21 dias para companhias abertas (segunda convocação com 8 dias de antecedência).

Já o inciso segundo permitia que elas deixassem de publicar os documentos de que trata o art. 133, desde que cópias autenticadas dos mesmos sejam arquivadas no registro de comércio juntamente com a ata de assembleia:

Art. 133. Os administradores devem comunicar, até 1 (um) mês antes da data marcada para a realização da assembléia-geral ordinária, por anúncios publicados na forma prevista no artigo 124, que se acham à disposição dos acionistas:

I – o relatório da administração sobre os negócios sociais e os principais fatos administrativos do exercício findo;

II – a cópia das demonstrações financeiras;

III – o parecer dos auditores independentes, se houver.

IV – o parecer do conselho fiscal, inclusive votos dissidentes, se houver; e (Incluído pela Lei nº 10.303, de 2001)

V – demais documentos pertinentes a assuntos incluídos na ordem do dia.

A exclusão dos incisos I e II, portanto, vão de encontro à criação dos incisos III e IV, reduzindo a burocracia e os custos das companhias.

De acordo com o inciso III, as publicações (exceto aquelas dispostas no art. 289 – balanço e demonstração de lucros e perdas) poderão ocorrer de forma eletrônica.

Essa era uma reivindicação antiga, em razão dos altos custos da publicação em jornais e revistas.

O inciso IV, por sua vez, veio permitir que os livros relacionados no art. 100 da LSA sejam substituídos por registros mecanizados ou eletrônicos.

Art. 100. A companhia deve ter, além dos livros obrigatórios para qualquer comerciante, os seguintes, revestidos das mesmas formalidades legais:

I – os livros de “Registro de Ações Nominativas” e “Registro de Ações Endossáveis”, para inscrição, anotação ou averbação:

I – o livro de Registro de Ações Nominativas, para inscrição, anotação ou averbação: (Redação dada pela Lei nº 9.457, de 1997)

a) do nome do acionista e do número das suas ações;

b) das entradas ou prestações de capital realizado;

c) das conversões de ações, de uma em outra forma, espécie ou classe;

c) das conversões de ações, de uma em outra espécie ou classe; (Redação dada pela Lei nº 9.457, de 1997)

d) do resgate, reembolso e amortização das ações, ou de sua aquisição pela companhia;

e) das mutações operadas pela alienação ou transferência de ações;

f) do penhor, usufruto, fideicomisso, da alienação fiduciária em garantia ou de qualquer ônus que grave as ações ou obste sua negociação.

II – o livro de “Transferência de Ações Nominativas”, para lançamento dos termos de transferência, que deverão ser assinados pelo cedente e pelo cessionário ou seus legítimos representantes;

III – o livro de “Registro de Partes Beneficiárias Nominativas” e o de “Transferência de Partes Beneficiárias Nominativas”, se tiverem sido emitidas, observando-se, em ambos, no que couber, o disposto nos números I e II deste artigo;

IV – os livros de “Registro de Partes Beneficiárias Endossáveis”, de “Registro de Debêntures Endossáveis” e “Registro de Bônus de Subscrição Endossáveis”, se tiverem sido emitidos pela companhia, observando-se, no que couber, o disposto sobre o “Livro de Registro de Ações Endossáveis”;

V – o livro de “Atas das Assembléias Gerais”;

VI – o livro de “Presença dos Acionistas”;

VII – os livros de “Atas das Reuniões do Conselho de Administração”, se houver, e de “Atas das Reuniões da Diretoria”;

VIII – o livro de “Atas e Pareceres do Conselho Fiscal”.

IV – o livro de Atas das Assembléias Gerais; (Redação dada pela Lei nº 9.457, de 1997)

V – o livro de Presença dos Acionistas; (Redação dada pela Lei nº 9.457, de 1997)

VI – os livros de Atas das Reuniões do Conselho de Administração, se houver, e de Atas das Reuniões de Diretoria; (Redação dada pela Lei nº 9.457, de 1997)

VII – o livro de Atas e Pareceres do Conselho Fiscal.  

Outra alteração significativa foram as inclusões dos parágrafos 4º e 5º do mesmo artigo:

O parágrafo 4º veio prever a hipótese de omissão do estatuto quanto à distribuição de dividendos, situação em que eles serão estabelecidos pela assembleia geral, deixando-se de aplicar o art. 202 da LSA, mas respeitando-se o direito dos acionistas preferenciais em receberem os dividendos fixos ou mínimos a que tenham direito.

O art. 202 da LSA estabele, por sua vez, que:

Art. 202. Os acionistas têm direito de receber como dividendo obrigatório, em cada exercício, a parcela dos lucros estabelecida no estatuto ou, se este for omisso, a importância determinada de acordo com as seguintes normas: (Redação dada pela Lei nº 10.303, de 2001) (Vide Medida Provisória nº 608, de 2013)  (Vide Lei nº 12.838, de 2013)

I – metade do lucro líquido do exercício diminuído ou acrescido dos seguintes valores: (Redação dada pela Lei nº 10.303, de 2001)

a) importância destinada à constituição da reserva legal (art. 193); e (Incluída pela Lei nº 10.303, de 2001)

b) importância destinada à formação da reserva para contingências (art. 195) e reversão da mesma reserva formada em exercícios anteriores;  (Incluída pela Lei nº 10.303, de 2001)

II – o pagamento do dividendo determinado nos termos do inciso I poderá ser limitado ao montante do lucro líquido do exercício que tiver sido realizado, desde que a diferença seja registrada como reserva de lucros a realizar (art. 197); (Redação dada pela Lei nº 10.303, de 2001)

III – os lucros registrados na reserva de lucros a realizar, quando realizados e se não tiverem sido absorvidos por prejuízos em exercícios subseqüentes, deverão ser acrescidos ao primeiro dividendo declarado após a realização. (Redação dada pela Lei nº 10.303, de 2001)

O que se pode verificar é que a LSA estabelecia como seria o pagamento do dividendo obrigatório, caso o estatuto fosse omisso.

Portanto, para se evitar que o estatuto fosse modificado a cada alteração no formato de pagamento dos dividendos, permitiu-se que essa definição fosse feita diretamente na assembleia.

Finalmente, o parágrafo 5º veio apenas estabelecer que “ato do Ministro de Estado da Economia disciplinará o disposto neste artigo.

Desta forma, a redação completa do art. 294 passou a ser a seguinte:

Art. 294. A companhia fechada que tiver receita bruta anual de até R$ 78.000.000,00 (setenta e oito milhões de reais) poderá:    (Redação dada pela Lei Complementar nº 182, de 2021)    Vigência

I – (revogado);    (Redação dada pela Lei Complementar nº 182, de 2021)    Vigência

II – (revogado);    (Redação dada pela Lei Complementar nº 182, de 2021)     Vigência

III – realizar as publicações ordenadas por esta Lei de forma eletrônica, em exceção ao disposto no art. 289 desta Lei; e    (Incluído pela Lei Complementar nº 182, de 2021)     Vigência

IV – substituir os livros de que trata o art. 100 desta Lei por registros mecanizados ou eletrônicos.    (Incluído pela Lei Complementar nº 182, de 2021)

§ 1º A companhia deverá guardar os recibos de entrega dos anúncios de convocação e arquivar no registro de comércio, juntamente com a ata da assembléia, cópia autenticada dos mesmos.

§ 2º Nas companhias de que trata este artigo, o pagamento da participação dos administradores poderá ser feito sem observância do disposto no § 2º do artigo 152, desde que aprovada pela unanimidade dos acionistas.

§ 3º O disposto neste artigo não se aplica à companhia controladora de grupo de sociedade, ou a ela filiadas.

§ 4º Na hipótese de omissão do estatuto quanto à distribuição de dividendos, estes serão estabelecidos livremente pela assembleia geral, hipótese em que não se aplicará o disposto no art. 202 desta Lei, desde que não seja prejudicado o direito dos acionistas preferenciais de receber os dividendos fixos ou mínimos a que tenham prioridade.    (Incluído pela Lei Complementar nº 182, de 2021)     Vigência

§ 5º Ato do Ministro de Estado da Economia disciplinará o disposto neste artigo.     (Incluído pela Lei Complementar nº 182, de 2021)

4.3. MODIFICAÇÃO NAS COMPETÊNCIAS DA CVM – ALTERAÇÃO ART. 294-A DA LSA

Assim dispunha o caput do art. 294-A:

Art. 294-A.  A Comissão de Valores Mobiliários, por meio de regulamento, poderá dispensar exigências previstas nesta Lei, para companhias que definir como de pequeno e médio porte, de forma a facilitar o acesso ao mercado de capitais.          (Incluído pela Medida Provisória nº 881, de 2019)

As modificações aqui consistiram na alteração do teor do caput e criação dos incisos I, II, III e IV.

Pela redação anterior, a Comissão de Valores Mobiliários – CVM “poderia” dispensar as exigências previstas na LSA, para companhias que ela mesma definir como de pequeno e médio porte (o que não mais será permitido, conforme novo art. 294-B, que será estudado adiante), como forma de facilitar o acesso ao mercado de capitais.

A nova redação veio estabelecer a “obrigação” da CVM regulamentar as condições facilitadas para o acesso de companhias de menor porte ao mercado de capitais, sendo permitida a ela dispensar ou modular a observância ao disposto nos seguintes artigos da LSA:

I – no art. 161 desta Lei, quanto à obrigatoriedade de instalação do conselho fiscal a pedido de acionistas;         (Incluído pela Lei Complementar nº 182, de 2021)

II – no § 5º do art. 170 desta Lei, quanto à obrigatoriedade de intermediação de instituição financeira em distribuições públicas de valores mobiliários, sem prejuízo da competência prevista no inciso III do § 3º do art. 2º da Lei nº 6.385, de 7 de dezembro de 1976; (Incluído pela Lei Complementar nº 182, de 2021)      Vigência

III – no inciso I do caput do art. 109, nos §§ 1º e 2º do art. 111 e no art. 202 desta Lei, quanto ao recebimento de dividendo obrigatório;  (Incluído pela Lei Complementar nº 182, de 2021)     Vigência

IV – no art. 289 desta Lei, quanto à forma de realização das publicações ordenadas por esta Lei; e        (Incluído pela Lei Complementar nº 182, de 2021)

Portanto, com esta alteração a CVM poderá dispensar ou modular a obrigatoriedade de instalação do conselho fiscal; a obrigatoriedade de ter uma instituição financeira intermediando as distribuições públicas de valores mobiliários; o recebimento de dividendo obrigatório e a realização das publicações do balanço e demonstração de lucros e perdas (art. 289 LSA).

No que se refere ao “recebimento de dividendo obrigatório”, as permissões de dispensa ou modulação foram com relação a:

  1. Impossibilidade de se privar o acionista dos direitos de participar dos lucros sociais (art. 109);
  2. Possibilidade das ações preferenciais sem direito de voto de adquirir o exercício desse direito se a companhia deixar de pagar os dividendos fixos ou mínimos a que fizerem jus, até que haja o pagamento, o mesmo ocorrendo na hipótese de ações preferenciais com direito de voto restrito, que terão suspensas as limitações ao exercício desse direito;
  3. Direito dos acionistas de receber como dividendo obrigatório a parcela dos lucros estabelecida no estatuto ou, se este for omisso, observar as normas estabelecidas nos incisos I, II e III, incisos estes que se aplicariam apenas para empresas com faturamento igual ou superior a R$78 milhões, por inteligência do §4º do art. 294 da LSA, que exclui empresas com receita inferior, permitindo a elas estabelecer estas regras em assembleia geral.

4.4. DEFINIÇÃO DE COMPANHIAS DE PEQUENO E MÉDIO PORTE – CRIAÇÃO ART. 294-B DA LSA

Como pudemos ver anteriormente, a alteração do art. 294-A permitia que a CVM estabelecesse a definição de companhias “de pequeno e médio porte”.

Art. 294-A.  A Comissão de Valores Mobiliários, por meio de regulamento, poderá dispensar exigências previstas nesta Lei, para companhias que definir como de pequeno e médio porte, de forma a facilitar o acesso ao mercado de capitais.          (Incluído pela Medida Provisória nº 881, de 2019)

O art. 294-B veio justamente para definir o conceito legal de companhias de pequeno e médio porte, que serão beneficiadas:

Art. 294-B. Para fins do disposto nesta Lei, considera-se companhia de menor porte aquela que aufira receita bruta anual inferior a R$ 500.000.000,00 (quinhentos milhões de reais).       (Incluído pela Lei Complementar nº 182, de 2021)

§ 1º A regulamentação editada não prejudica o estabelecimento de procedimentos simplificados aplicáveis às companhias de menor porte, pela Comissão de Valores Mobiliários, com base nas competências previstas na Lei nº 6.385, de 7 de dezembro de 1976, especialmente quanto:        (Incluído pela Lei Complementar nº 182, de 2021)     Vigência

I – à obtenção de registro de emissor;         (Incluído pela Lei Complementar nº 182, de 2021)      Vigência

II – às distribuições públicas de valores mobiliários de sua emissão; e (Incluído pela Lei Complementar nº 182, de 2021)     Vigência

III – à elaboração e à prestação de informações periódicas e eventuais. (Incluído pela Lei Complementar nº 182, de 2021)     Vigência

§ 2º A Comissão de Valores Mobiliários poderá:         (Incluído pela Lei Complementar nº 182, de 2021)     Vigência

I – estabelecer a forma de atualização do valor previsto no caput deste artigo e os critérios adicionais para a manutenção da condição de companhia de menor porte após seu acesso ao mercado de capitais; e (Incluído pela Lei Complementar nº 182, de 2021)     Vigência

II – disciplinar o tratamento a ser empregado às companhias abertas que se caracterizem como de menor porte nos termos do caput deste artigo. (Incluído pela Lei Complementar nº 182, de 2021)    Vigência

Como se percebe acima, o parágrafo 1º visa proteger os procedimentos simplificados que tenham sido estabelecidos pela CVM para empresas de menor porte, especialmente aqueles procedimentos constantes de seus incisos I, II e III.

O parágrafo 2º, por sua vez, permite que a CVM estabeleça a forma de atualização do valor previsto no caput do referido artigo, assim como eventuais critérios adicionais para manter a condição de companhia de menor porte após o seu acesso ao mercado de capitais. Também estabelece que a CVM poderá disciplinar o tratamento que será empregado às companhias abertas que se caracterizem como de menor porte.

5. CONCLUSÃO

As modificações chegam em um momento importante, pós pandemia.

Importante destacar que a LC 182 entrou em vigor no último dia 02/09, ou seja, 90 dias após sua publicação, contando-se o prazo respeitando o art. 8º da LC95/98, ou seja, “com a inclusão da data da publicação e do último dia do prazo, entrando em vigor no dia subseqüente à sua consumação integral.”

Portanto, acreditamos que estas modificações são benéficas e diretamente tornarão a escolha das sociedades anônimas cada vez mais comum, desburocratizando o ambiente de negócios e incentivando, de forma indireta, a inovação, os investimentos e a economia em termos gerais.

6. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de Direito Comercial. Direito de Empresa. Sociedades. São Paulo: Saraiva, 2008.

NYBO, Erik F et al. Direito das Startups. Curitiba: Juruá, 2016.


[1] Artigo originalmente publicado no livro Direito Societário – Desafios Atuais e Pós-Pandêmicos, Editora Expert, 2021, ISBN 978-65-89904-37-3.

[2] Sócio da Silva Freire Advogados, cofundador do Instituto de Formação de Líderes do Brasil – IFL, membro da Comissão de Direito Societário da OAB/MG, membro do IBGC, membro do IAMG.

[3] Estatísticas em tempo real. Disponível em <startupbase.com.br/home/stats>. Acesso em 14/09/21.

[4] Art. 143 da LSA: A Diretoria será composta por 1 (um) ou mais membros eleitos e destituíveis a qualquer tempo pelo conselho de administração ou, se inexistente, pela assembleia geral, e o estatuto estabelecerá:

[5] Disponível em < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/lcp/Lcp182.htm>. Acesso em 14/09/21.

[6] Disponível em < https://www.gov.br/governodigital/pt-br/mapa-de-empresas/boletins/mapa-de-empresas-boletim-do-1o-quadrimestre-de-2021.pdf>. Acesso em 14/09/21.


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