Por: Luis Felipe Silva Freire, advogado, professor e sócio da SILVA FREIRE ADVOGADOS
Adriano de Andrade Muzzi, advogado, coordenador da área societária da SILVA FREIRE ADVOGADOS
Passados oito anos da promulgação da lei que rege as falências e as recuperações judiciais no Brasil, Lei nº 11.101/2005, é certo que já se pode fazer um balanço positivo deste, já não tão novo, diploma legal, especialmente no que concerne à Recuperação Judicial. Publicada em fevereiro de 2005, a lei entrou em vigor em junho do mesmo ano.
Atualmente, grandes conglomerados empresariais veem o Brasil como uma das melhores opções de investimento, de sorte que a economia nacional está se fortalecendo em diversos ramos.
É certo, no entanto, que grande parte das empresas passam por momentos de crise, os quais, por vezes, podem ser superados. E foi justamente nessa premissa que a Lei nº 11.101/2005, ao estabelecer o instituto da Recuperação Judicial das empresas, se baseou. Pode-se dizer, em outras palavras, que a recuperação judicial tem como objetivo principal a efetivação do princípio da continuidade das empresas, que é um corolário do princípio da livre iniciativa, estatuído no art. 170 da Constituição da República.
Com o passar do tempo, algumas experiências bem sucedidas demonstraram que esse instituto tem o condão de reestabelecer empresas economicamente viáveis. E o faz privilegiando, primordialmente, o diálogo entre a empresa em recuperação e os seus credores, para que sejam estabelecidos novos prazos e meios de pagamento dos débitos da empresa em dificuldades. Além disso, o comitê de credores também pode ajudar na fiscalização e condução dos negócios. De mais a mais, já se pode afirmar que a referida lei estabeleceu, aos olhos da comunidade internacional, um ambiente de maior segurança jurídica no Brasil.
Por isso é que a Recuperação Judicial é benéfica aos credores, pois permite que a empresa se recupere e se torne novamente superavitária para que consiga saldar completamente suas dívidas, ainda que a longo prazo. Isso dificilmente ocorre na falência, pois a simples alienação do patrimônio da empresa geralmente não é suficiente para a quitação completa de todos os débitos.
Apesar disso tudo, muitas empresas em dificuldades ainda preferem sucumbir, vindo a definhar em processos de falência requeridos pelos credores, ou se dissolver irregularmente, a se reestruturar por meio da Recuperação Judicial. Nos Estados Unidos, por outro lado, as empresas reconhecem, com maior facilidade, que estão passando por dificuldades momentâneas e requerem a Concordata, análoga à Recuperação Judicial brasileira. Gigantes como a American Airlines e a Kodak são exemplos dessa prática, sendo que muitas empresas conseguem, efetivamente, se recuperar. Prova disso é o famoso caso da WorldCom, em que a direção foi substituída e a empresa recuperada em três anos, sendo, atualmente, uma das maiores empresas de telecomunicações do mundo.
É evidente que a lei, por si só, não salva nenhuma empresa, devendo haver uma associação de outros elementos, notadamente de gestão, para que ela se recupere. Esses elementos devem estar presentes no “Plano de Recuperação Judicial”, que pode indicar quais os prazos e condições especiais que a empresa precisa para pagamento das obrigações vencidas ou vincendas, eventual cisão, incorporação, fusão ou transformação da sociedade, alteração do controle societário, aumento de capital social, redução salarial, venda de bens, entre diversos outros. O plano deve também ser viável e lícito para que possa ser aprovado pela assembleia de credores e passar pelo crivo do controle de legalidade do Poder Judiciário. Em razão de toda essa singularidade, o plano deve ser elaborado por uma equipe multidisciplinar, a quem caberá analisar e indicar os melhores caminhos nas áreas trabalhista, tributária, societária e civil, entre outras que podem ser necessárias conforme a realidade da empresa.
O Poder Judiciário, especialmente o STJ, tem exigido que os planos de recuperação judicial, ainda que aprovados de forma legítima pela assembleia de credores, devem possuir cláusulas lícitas, sendo certo que, quando chamado para tanto, o Poder Judiciário poderá efetuar um controle de licitude do plano.
Por todos esses motivos, pode-se dizer que o instituto da Recuperação Judicial recuperou a confiança do mercado. É importante lembrar que a proteção desses credores é de grande importância não apenas para a iniciativa privada, mas para a sociedade como um todo, por tornar as transações mais seguras, com mais garantias, incentivando, portanto, o investimento privado e a circulação de renda, propiciando o crescimento econômico, tão importante para o pleno desenvolvimento do país.