Diretor da SFA concede entrevista ao Tribunal de Justiça de Minas Gerais – TJMG

CDC: um direito protetor

Geraldo Magela da Silva Freire. 

Veja abaixo a entrevista que o Diretor da Silva Freire Advogados, Dr. Geraldo Magela da Silva Freire, concedeu ao à Revista In Foco do Tribunal de Justiça de Minas Gerais – TJMG, sobre o Código de Defesa do Consumidor.

 Número 6 | Mar 2011 – Jun 2011 | Belo Horizonte/MG

Segundo o advogado Geraldo Magela da Silva Freire: o direito do consumidor, muitas vezes, não é respeitado porque as  pessoas não entendem a filosofia do CDC – quem fornece produto ou serviço tem como se ressarcir do prejuízo ao indenizar o consumidor. 

In Foco – O senhor poderia nos falar sobre o Código de Defesa do Consumidor (CDC)?

Geraldo Magela da Silva Freire – Com a produção de produtos em massa, a comercialização é em massa e, consequentemente, há também um consumo em massa. O direito do consumidor vem de uma necessidade da sociedade de fazer com que as riquezas circulem, por isso ele é um direito protetor. Ou seja, pelo fato de o consumidor ter sido traído em sua legítima expectativa, ele já tem o direito de ser indenizado. Ele tem de provar que existe uma aquisição que foi lesiva da expectativa dele. 

Porque essa filosofia? Seria injusto com o fornecedor de produtos e serviços?

Não, toda a filosofia do CDC tem o sentido de que os custos sociais da produção em massa têm de ser suportados pelo fornecedor de produtos e serviços, porque ele pode indenizar o consumidor vítima e recuperar o seu prejuízo aumentando a produtividade ou o preço. Por exemplo, uma fábrica produz mil unidades e indeniza dez consumidores, então ela deve produzir mais unidades para se ressarcir. Já o consumidor, que é obrigado a consumir, a gerar riquezas, não é especialista em produzir bens de consumo, por isso ele é protegido.

Tendo havido produção em massa, os produtos também saem com defeito em massa, 5% dos produtos saem de fábrica com defeito de mão de obra ou de peças. Uma empresa que fabrica 10 mil carros por dia troca 500 carros por dia, o correspondente a 5% de sua produção? Evidentemente que não troca. O direito do consumidor, muitas vezes, não é respeitado porque as pessoas não entendem a filosofia do código – quem fornece produto ou serviço tem como se ressarcir do prejuízo ao indenizar o consumidor. O consumidor não tem como se ressarcir, ele paga preços extorsivos, juros extorsivos para ter um bem que lhe traga prazer. O CDC é de 1990, é um direito novo, revolucionário.

 Como o consumidor deve agir nas suas relações de consumo?

O artigo 18 do CDC fala expressamente que, se o vício do produto não for sanado em 30 dias, o consumidor pode exigir a troca do produto, a devolução do dinheiro corrigido ou o abatimento no preço.

Primeiro o consumidor deve tentar sanar o problema diretamente com a empresa. Se o problema não for resolvido, é interessante mandar uma carta para ficar documentado. A carta deve ser enviada ao fabricante e ao fornecedor do produto ou serviço pelo correio, registrada com aviso de recebimento. E, na carta, ele pode pedir, por exemplo, a devolução do dinheiro dentro de determinado prazo a partir do recebimento da carta.

Nos casos de produtos comprados fora de estabelecimentos comerciais – pela internet ou por vale postal –, o consumidor tem até sete dias para desfazer a compra imotivadamente, isto é, sem dar razões. 

E nos casos de golpes através de compras pela internet?

É mais complicado, porque envolve a operadora de internet que hospeda os ambientes virtuais. Para chegar ao golpista, é necessário quebrar o sigilo bancário dos suspeitos, solicitar à provedora de internet o IP (internet protocol) da máquina que foi utilizada, o dia e a hora da suposta compra.

Para se cercar de garantias, quando se trata de compra pela internet, o consumidor tem de se certificar de que o site é confiável e idôneo. Quando o site é de ocasião, costuma funcionar apenas por dois ou três dias.

 Como proceder para cancelar uma compra feita por meio eletrônico?

Se a entrega passar do prazo, o consumidor não é obrigado a manter o contrato. Se a operadora do cartão de crédito ainda não tiver efetuado o pagamento ao comerciante, é possível solicitar o cancelamento da transação. Caso a operadora já tenha creditado, o consumidor tem de entrar em contato com o vendedor.

Quando o consumidor pede o cancelamento da compra por telefone, a operadora tem de fornecer o número do protocolo de atendimento. O consumidor também pode fazer o pedido de cancelamento pelo correio, através de carta registrada com aviso de recebimento.

O direito do consumidor se aplica indistintamente, independentemente da forma de aquisição, se a distância ou presencial. 

E quando o cartão de crédito faz cobranças indevidas?

O consumidor tem de pedir à operadora que se comprometa a fazer o crédito do valor correspondente na fatura seguinte.

Se uma cobrança indevida acaba por levar o nome do consumidor para os cadastros de inadimplentes, o consumidor ainda pode requerer danos morais à Justiça. 

Há seguradoras que sempre alegam um pretexto para não cumprir o contrato. Quais são os direitos do consumidor nesses casos?

As seguradoras verificam o perfil do consumidor para calcular o valor dos seguros, mas esse perfil não pode alterar o direito do consumidor. Por exemplo, mesmo que o consumidor tenha informado à seguradora que possui garagem e, por algum motivo, deixe seu carro na rua e ele seja roubado, o consumidor continua tendo o direito de receber a indenização. Se acontecer um acidente com um outro condutor cujo nome não foi informado à seguradora, continua também o direito de o segurado receber o valor correspondente ao dano. O perfil do segurado, verificado pela seguradora, não exime a empresa da responsabilidade civil. As seguradoras sempre arrumam artifícios para não pagar. 

No caso de compra de imóvel, há muitos questionamentos nas relações de consumo?

Para comprar imóvel, é bom consultar uma pessoa especializada, porque é necessário tirar certidões de ônus reais, ônus pessoais, certidões dos sócios, caso o vendedor seja pessoa jurídica. Se a compra for de imóvel na planta, a orientação é de somente comprar de construtora superidônea para não ter surpresas desagradáveis, como não receber o imóvel.

O consumidor não deve se deixar influenciar pelas propagandas e deve ficar muito atento com as cláusulas abusivas que, mesmo constando do contrato, não devem ser respeitadas, porque a lei está acima do contrato.

Quanto aos prazos de entrega, as construtoras colocam uma cláusula segundo a qual vão entregar o imóvel em tal data, mas a entrega pode demorar mais seis meses. Esse é um exemplo de cláusula abusiva. O consumidor não pode atrasar a prestação por seis meses; porque a construtora poderia atrasar a entrega do imóvel? Há países em que os prazos são respeitados.

 Como o consumidor deve se comportar para resolver um problema de consumo?

Primeiro, procurar o serviço de atendimento da própria empresa, embora a gente saiba que, em geral, elas não resolvem. Depois, procurar o Procon, que não tem o poder de determinar o cumprimento da obrigação, mas tem poder administrativo de convocar a empresa para saber das razões. Se, com o auxílio do Procon, o consumidor não conseguir resolver administrativamente, ele procura o Juizado das Relações de Consumo. É importante ter a cópia das razões alegadas pelo produtor ou fornecedor do produto ou serviço. Se a causa for de até 20 salários mínimos, o consumidor não precisa de advogado, se for de 20 a 40 salários mínimos, será preciso contratar um advogado.

O consumidor também pode enviar à empresa uma notificação extrajudicial, isto é, uma carta explicando o acontecido, enfatizando o dia da compra e o defeito apresentado, que deve ser enviada pelo correio de forma registrada e com aviso de recebimento.

 E quanto às garantias previstas no CDC?

O prazo de garantia legal é de 30 dias para bens não duráveis e 90 dias para bens duráveis. Mas se a empresa der um ano de garantia, então soma-se aos 90 dias legais o tempo de garantia oferecido pelo fabricante. À garantia contratual se soma a garantia legal. 

E no caso de acidente de consumo que gera dano físico ao consumidor?

Acidente de consumo é o acidente decorrente de um defeito do produto. Nesse caso, o consumidor tem direito à reparação do dano material e também moral. O consumidor atingido tem até cinco anos, após o acidente, para solicitar indenização. 

Há grande número de reclamações na Justiça contra empresas de telefonia celular e de TV por assinatura. Como o consumidor deve proceder?

Sempre que ligar, anotar o número do protocolo de atendimento para ter como provar, caso necessite acionar a Justiça. Mas, eu te confesso que tem coisas que me parecem não ter solução…

 Há empresas que ficam renovando contratos automaticamente, como os de assinatura de revistas e jornais. O que o consumidor deve fazer nessa situação?

É mais fácil solicitar um novo cartão de crédito à operadora do que pedir para cancelar a renovação, porque o novo cartão de crédito vem com a numeração diferente, e a empresa não tem como fazer a renovação da assinatura. 

Quais documentos o consumidor deve manter?

Contratos, notas fiscais, garantias, e-mails. Os e-mails são importantes como provas porque têm as alegações das partes, além das datas e horários. Se a reclamação for feita por telefone, sempre anotar o número do protocolo de atendimento. 

Perfil

Nome: Geraldo Magela Silva Freire
Advogado, especialista em direito do consumidor. 

Fonte:http://www.tjmg.jus.br/revista/numero_06/depoimentos/depoimento1.htm