Entrevista do Dr. Geraldo Magela Silva Freire publicada no Jornal Estado de Minas de 10 de setembro de 2008.
LEILÃO
Cilada ou cartada?
Modalidade que permite compra de veículo por lances pode ser interessante, mas é preciso ficar atento às artimanhas comuns a quem já está habituado com o negócio
Paula Carolina
O leilão é uma modalidade de licitação, regido pela Lei 8.666, de 1993, e, sendo assim, na compra de carro em leilão – forma de negócio que vem ficando cada vez mais comum no Brasil – algumas regras podem ser diferentes das relações de consumo habituais. Os tipos de leilão de veículos mais conhecidos são os de salvados (frutos de indenização de seguro), recuperados de furto/roubo e tomados por financeiras porque o dono não conseguiu pagar as prestações. Atualmente, porém, com o desaquecimento do mercado de veículos usados no Brasil, o leilão dos carros parados nos pátios das concessionárias e revendas não autorizadas tem-se colocado como nova oportunidade de venda e giro desses estoques. De maneira geral, vendedores, leiloeiros e compradores têm interesses distintos, mas todos podem se dar bem conhecendo a fundo as regras do jogo. Do contrário, o comprador mais desavisado pode ter problemas.
EDITAL O leilão pode ser administrativo – situação de veículos apreendidos pelos Detrans, por exemplo – e, neste caso, é nomeado um servidor público para sua execução. Ou comum, como os casos já descritos, que são os mais conhecidos e procurados por consumidores em busca de um bom negócio. Para essa situação, é designado um leiloeiro, profissão que foi regulamentada em 1932 e é regida pelo Decreto Federal 21.981. Nas duas situações, o advogado Bruno Augusto Loureiro Leandro, especialista em licitações, explica que a publicação de edital é a chave de tudo. “Nos editais, têm de constar datas e locais de visitação, para que se conheça o estado do carro. Quem discordar tem prazo de cinco dias úteis para impugnar o edital”, explica. O questionamento pode ser feito por qualquer cidadão, por escrito, e encaminhado à comissão organizadora ou ao próprio leiloeiro. Prestar atenção no edital é fundamental para não cair em armadilha.
GARANTIA Num leilão, o bem é vendido “no estado em que se encontra”, não podendo haver reclamação posterior, e essa é uma das maiores vantagens apregoadas pelos leiloeiros, já que o vendedor (seja agência, concessionária, banco etc.) não tem de dar garantia do carro. Mas Bruno alerta: “tudo vai depender do que estiver escrito no edital. Se a inspeção permitida foi meramente visual, o arrematante não vai poder reclamar de um amassado, por exemplo, mas pode pedir a anulação se houver defeito oculto”. “A pessoa não pode reclamar da qualidade, mas o carro de que estar funcionando”, completa o advogado Geraldo Magela Freire, presidente da Comissão de Defesa do Consumidor da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), seção Minas Gerais.
Já se no edital constar que é possível experimentar, ligar o carro, por exemplo, os direitos de reclamação diminuem, mas, ainda assim, não pode haver fraude. “Por isso é importante a presença do mecânico no momento da visitação. Mas, mesmo assim, se depois de comprar o carro for constatado que o chassi está adulterado, também pode pedir a anulação”, afirma Bruno Leandro. Outros problemas comuns do arremate de um veículo são a documentação, que nem sempre está em dia, e a dificuldade em se fazer seguro novamente, quando o carro está sendo leiloado por ter sido objeto de perda total.
PSICOLÓGICO “O leilão é venda puramente psicológica.” A definição é do presidente da Associação Brasileira de Leiloeiros, Luiz Sodré Santoro, leiloeiro oficial do estado de São Paulo, desde 1979. E é este outro ponto de atenção. Santoro conta que era comum, principalmente no passado, a demonstração de competitividade e poder financeiro entre os compradores. Outra prática recorrente era a participação de marido e mulher, dando lances separadamente, para incrementar o preço do objeto. Por isso, acompanhamento de psicólogos passou a ser interessante para se obter melhor resultado nas vendas. “Eles passaram a observar e a dizer como o leiloeiro deve se portar com o público, a maneira de vestir, de falar, a perspicácia de saber como falar para cada público e obter o melhor preço”, diz.
Exatamente por causa de todo o contexto psicológico que envolve os lances, a psicóloga e consultora organizacional Carmem Bretas Bavoso aconselha: “ O comprador deve ir ao leilão sabendo exatamente o que quer comprar e até que preço pode chegar”. Ela lembra que à técnica dos leiloeiros é semelhante a dos vendedores, que sempre tentam convencer o consumidor de que está fazendo a melhor escolha, daí a importância de se ter clareza no momento do lance. “É preciso saber bem o que se quer para, por exemplo, não comprar picape cabine simples, porque está em bom estado e pouco rodada, quando o objetivo era um automóvel para levar três filhos”, exemplifica. “O leilão é um tipo de disputa, inconsciente. E o leiloeiro usa dessa situação dando a idéia de que quem der o maior lance está vencendo. O consumidor não se deve deixar entusiasmar”, acrescenta.
Fonte: Jornal Estado de Minas