Artigo publicado em 24 de dezembro de 2002
Jornal Estado de Minas
Seção Opinião, p. 7
Autor: Dr. Geraldo Magela S. Freire – OAB/MG 15.748
NATAL DA ESPERANÇA
Geraldo Magela S. Freire
Advogado – Diretor da União dos Juristas Católicos
Jesus Cristo veio na forma de uma criança pobre e humilde, nascida numa manjedoura da periferia, para ser um de nós, trazendo um projeto de vida e liberdade, com fraternidade e partilha. Com a razão enxergamos um menino-Homem. Com a fé um menino-Deus. E pretendendo habitar no nosso coração, sem opressão ou submissão, porque alicerçado no amor. Precisamos trazer essa luz que não se apaga para o nosso meio, para aliviar as dores da vida, para enxugar as nossas lágrimas e recuperar a alegria e a esperança de viver.
Leonardo Boff, escrevendo sobre o NATAL, que é um dos pontos altos da espiritualidade cristã, diz que “há dentro de nós uma chama sagrada coberta pelas cinzas do consumismo, da busca de bens materiais, de uma vida distraída das coisas essenciais. É preciso remover tais cinzas e despertar a chama sagrada. E então irradiaremos. Seremos como o sol.”, pois o Natal “Vive da alegria de ver uma vida nascendo, porque não pode haver tristeza quando nasce a vida. O Natal quer ressuscitar essa dimensão espiritual no ser humano”.
Viktor E. Frankl, criador da Logoterapia, com a experiência pessoal trágica dos campos de concentração nazistas, trouxe a noção de transcendência para a psicologia, que inclui o espiritual, quando constatou que, mesmo diante dos sórdidos sofrimentos de fome, trabalhos forçados e tortura, as vítimas recusavam encostar-se às cercas eletrificadas, optando pela vida, dando sentido à dor e sobrevivendo na esperança.
Diz que, além da impulsividade inconsciente do instinto de Freud, existe uma espiritualidade inconsciente – uma religiosidade reprimida por parte da razão absoluta ou da inteligência tecnicista – que deve ser libertada (Frankl, Vitor E., in A Presença Ignorada de Deus).
Nos últimos anos, cresceram as campanhas de Natal sem fome. É a solidariedade coletivizada. É a partilha com os que nada têm. Coincidência ou não, elegemos um presidente-operário, cuja prioridade é matar a fome de 50 milhões de brasileiros. É tempo também de um exame de consciência, de uma reflexão. De quantos matamos a fome neste ano? Ter compaixão e ajudar os outros é a maneira mais eficaz de obter felicidade genuína, diminuindo nossa sensação de sofrimento, como ensina o Dali Lama (Uma Ética Para Um novo Milênio).
Dom Serafim Fernandes de Araújo, escrevendo sobre o Advento, diz que renasceu no povo a esperança: “Cansado de ver suas esperanças frustradas por governos que privilegiam muito mais os interesses das elites, em prejuízo da dignidade humana de milhões de brasileiros sempre sobrecarregados com a maior cota de sacrifícios, o povo decidiu nas urnas dar uma guinada nessa política. Agora delineia no horizonte uma possibilidade real para os pobres deste país: a de verem implantadas aquelas políticas que, finalmente, atenderão as suas seculares demandas.”. Mas, adverte que se “a esperança nasceu, ela ainda tem de aprender a caminhar, a falar, a crescer e a tomar decisões para que o que ela significa seja realizado em toda a sua capacidade transformadora”.
Por isso, este é o Natal da esperança, porque todos estão cheios dela. É a passagem do mar Vermelho dos brasileiros, quando o povo de Deus, portadores da fé, saiu do mundo da opressão para o mundo da liberdade, e os pobres e humildes começam uma nova caminhada para erradicar a opressão da fome. Com esperança de que o resto vem depois, tudo voltado para uma relação social justa, fundada na justiça e na fraternidade, neste País que estamos construindo.
Mas, para que isso aconteça, neste Advento do Menino Jesus, deixe o menino-Deus invadir seu coração. O Natal é o símbolo do renascimento que expulsa o orgulho e a ambição dos corações, neles deixando coroas de perdão e mensagens de fraternidade e partilha. Natal quer dizer pão para o corpo e o espírito. Não se vive simplesmente por viver. Vivemos para conviver com nossos irmãos, filhos do mesmo Deus.
(Jornal Estado de Minas em 24 de dezembro de 2002, Seção Opinião, p. 7)